sábado, 21 de maio de 2011

Crítica: Tempos Modernos



Tempos Modernos
Modern Timer (EUA, 1936), escrito e dirigido por Charles Chaplin; com Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Tiny Sandford, Chester Conklin, Hank Mann, e outros.


Tempos Modernos é o ponto alto da carreira de Charlie Chaplin. Novamente escritor, diretor e protagonista, o cineasta faz não apenas um trabalho incrivelmente engraçado, mas um filme que carrega consigo uma crítica pertinente ao mundo capitalista e, sobretudo, à vida dos americanos no período da crise da década de 30, ocasionada pela queda da bolsa de valores de Nova Iorque. Narrando mais uma história do mais famoso vagabundo, o filme nos apresenta a um Carlitos agora operário de uma fábrica que, sob um regime de trabalho excessivo e desumano, acaba enlouquecendo e sendo internado em um hospício. Recuperado de todo o desgaste sofrido, o personagem sai em busca de uma vida digna, mas percebe-se em meio a uma sociedade competitiva e desigual.


Com uma introdução explicativa - que, à base de uma legenda, expõe toda a idéia que gira em torno do longa, funcionando quase que como um epígrafe -, o filme, em seus dois primeiros planos, logo se encarregam de revelar a posição ideológica de Chaplin a respeito do capitalismo e da forma como é tratada e encarada a mão-de-obra operário pelas grandes indústrias e corporações que visam o lucro acima tudo. Utilizando uma técnica de montagem forjada no cinema soviético dos anos XX, mais exatamente por Sergei Eisenstein, o cineasta hollywoodiano justapôs dois planos distintos e aparentemente sem possíveis correlações, que, separadamente, tinha cada um sua mensagem particular, mas que, quando unidos, possuem um novo sentido e produzem um choque. Os referidos planos são, respectivamente, o de um rebanho que se move para fora de um curral e o de uma multidão que sai de uma estação de metrô subterrâneo às pressas em busca de cumprir sua lida. Mesmo que a comparação visual através do choque de imagens não tenha sido executada com a sutileza e em um ponto dramático da narrativa assim como fez Eisenstein onze anos antes, em A Greve, o recurso funciona perfeitamente bem na abertura do projeto como forma de ilustrar eficazmente a idéia que é posteriormente desenvolvida.

Não resumindo o subtexto crítico apenas à esse momento, o roteiro procura contextualizar a realidade dos EUA e do domínio do capitalismo, em plena crise, através da história de Carlitos, levando este a sofrer as consequências das difíceis situações da classe média e baixa da época. Dessa forma, presenciamos a polícia reprimindo truculentamente movimentos sociais do proletariado, e em outro momento, somos surpreendidos pelo personagem que, após ter cumprido sua pena temporária na prisão, é acometido pelo hilário desejo em retornar para o "conforto" das instalações presidiárias, tentando de todas as formas ser novamente encarcerado. Da mesma forma, as imagens na fábrica ilustram de forma cômica todo o sofrimento e pressão que os operários daquele exato período sofriam, assim como as cenas que se passam num casebre prestes a desabar - que, por sinal, rendem boas gags - ou as imagens quase que recorrentes de pessoas pobres, párias, detentos, e por fim, os operários tratados como animais. Chaplin, inclusive, compõe em determinado momento do longa a metrópole que serve de cenário para o filme de uma forma caótica, utilizando planos rápidos e inclinados de imagens confusas de caos típico de uma grande cidade.

O segundo momento do longa, porém, se encarrega de retratar as diferenças sociais entre as classes e o desejo e a luta de uma população pobre que já sonhava com o ideal de vida (americano), mas claro, através do personagem central e sua parceira (Goddard) de aventura do momento. Contando com mais uma bela interpretação do vagabundo da coleção de Chaplin, Tempos Modernos é repleto de situações e gags divertidas: em destaque a cena que nos mostra a fértil, tocante e engraçadíssima imaginação de Carlitos sobre seu possível futuro com sua parceira pobre em uma sonhada casa própria. O trabalho de Goddard, aliás, parece ter combinado perfeitamente com o de Chaplin nesse longa, exibindo ambos uma formidável química - e a história da personagem, pobre e sozinha, contribui muito bem para compor esse pequeno quadro da crise do capitalismo na sociedade americana da época.

Último  filme mudo de Chaplin, Tempos Modernos já dá indícios da progressiva e inevitável redenção do cineasta - sempre assumidamente averso ao som no cinema - à tecnologia sonora, ao utilizar efeitos de som e, principalmente, presentear o espectador da época pela primeira vez com a sua voz em um gozado número de dança e canto nos últimos instantes do longa, marcando assim sua transição definitiva para o novo momento do cinema. Tendo o completo conhecimento de sua importância e função no momento difícil da economia mundial, e principalmente americana, o grande artista fez de Tempos Modernos uma experiência reflexiva e, ao mesmo tempo, levemente reconfortante, para aqueles que sofriam os duros dias dos modernos tempos que já se passaram.

Cotação: Excelente

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