Apocalypse Now (EUA, 1979), dirigido por Francis Ford Copolla, escrito por Francis Ford Copolla e John Milius, com Martin Sheen, Marlon Brando, Robert Duvall, Frederic Forrest, Sam Bottoms, Harrison Ford, Dennis Hopper, Laurence Fishburne e outros.

Uma adaptação do livro Heart of Darkness, de Joseph Conrad, o filme tem início mostrando-nos de cara um grande bombardeio de Napalm (mistura de gasolina e uma resina natural que, em combustão, gera temperatura de cerca de 1000 ºC), helicópteros e destruição, ao som da certeira e bela canção The End, do grupo The Doors. A seqüência é hábil ao ilustrar em poucos minutos o efeito da guerra na mente do capitão Willard (Sheen), que com seu rosto enquadrado de cabeça para baixo, surge em meio a essas imagens de guerra através de um efeito de fusão destas (transição progressiva). Da mesma forma, Copolla se utiliza do som do ventilador de teto do pequeno quarto, que se assemelha ao de uma hélice de um helicóptero, para indicar a obsessão do personagem pela guerra. A partir daí, somos levados a acompanhar a história do personagem que, designado por um alto comando do exército americano, deve subir o rio até o Camboja para encontrar e matar Kurtz (Brando) - um coronel que enlouqueceu em meio a guerra, chegando a assassinar supostos inocentes e a comandar um grupo de fanáticos que o tratam como um deus. Durante esse percurso, escoltado por uma equipe, Willard se depara com situações inacreditáveis da guerra enquanto investiga documentos sobre Kurtz, criando uma curiosidade e inquietação a respeito deste.
Escrito pelo próprio Copolla juntamente com John Milius, o roteiro de Apocalypse Now nos leva a acompanhar desde os primeiros instantes o ponto de vista do protagonista em relação a guerra através de uma eficiente narração em off do personagem, surgindo sempre em momentos pontuais do filme, principalmente aqueles em que ele examina os documentos sobre o veterano. Assim, quando Willard vai progressivamente desconfiando de uma possível sanidade do coronel Kurtz, somos levados a partilhar da mesma suspeita - a relação dos dois personagens, aliás, é um dos pontos mais importantes do filme: ao mesmo tempo em que o protagonista tenta compreender o que levou Kurtz a sua "rebeldia" frente ao exercito americano, ele vai tomando consciência do verdadeiro sentido da guerra, nutrindo uma espécie de admiração e estranhamente por este.
Beneficiado por inteligentes e reflexivos diálogos, o filme nos leva a pensar sobre as circunstâncias impressionantes e absurdas apresentadas com certa constância durante todo o longa, como por exemplo, a imagem de soldados abandonados implorando para serem resgatados ou o momento em que os homens que acompanhavam Willard matam cruelmente nativos que estavam em um outro barco - mostrando um completo desequilíbrio e falta de sensibilidade -, para então, ao descobrirem que uma mulher sobreviveu, despertarem um resquício de humanidade. Mas mais chocante são os instantes em que Copolla explora o caráter hipócrita dos líderes por trás da guerra. Se no início do filme fica claro, por parte de um general, que a morte de Kurtz foi decretada porque este está operando "totalmente além de qualquer padrão de conduta humana aceitável", durante o filme inteiro vemos o inverso de qualquer padrão de conduta decente, ou seja, imagens aterradoras e cruéis promovidas pelo próprio exercito americano.
Mas um dos momentos mais inesquecíveis de Apocalypse Now se trata da seqüência montada de forma belíssima, que mostra um esquadrão de helicópteros atacando uma vila de vietnamitas ao som da emblemática Cavalaria das Valquírias, de Richard Wagner - momento que, com certeza, está marcado na história do cinema. A trilha sonora composta por Francis Ford e Carmine Copolla, por outro lado, surge sempre tensa e misteriosa, servindo em muitos momentos para compor o quadro de horror "orquestrado" pelo talentoso diretor - como pôde ser visto na perturbadora seqüência da ponte Lung, que retrata o completo desespero e loucura dos soldados que estavam submetidos naquele lugar do Vietnã, através de um cenário composto de forma infernal e quase surrealista.
Com extremo êxito ao tentar provocar incômodo no espectador com imagens fortes e planos inquietantes, o diretor de fotografia Vittorio Storaro aposta em uma fotografia granulada que ressalta a crueza da imagem, assim como se concentra nas cores quentes e no sépia no intuito de reproduzir um ambiente quente, úmido e selvagem - e mais importante ainda foi a sua feliz escolha em mostrar o coronel Kurtz, quando este finalmente surge, sempre envolto de sombras, indicando seu caráter misterioso e a perda da sua própria personalidade e sanidade. Mas o impacto causado pelo personagem se deve, principalmente, a forte interpretação de Marlon Brando, que surge decadente, ameaçador e instável. Enquanto isso, Martin Sheen foi eficiente ao interpretar Willard como um sujeito transtornado que aparece sempre concentrado, incapaz de se entregar a uma distração, mas que cada vez mais se ver intrigado com a figura de Kurtz.
Mas a atuação mais marcante, no entanto, é a de Robert Duvall como o tenente-coronel Kilgore. Por mais divertida que tenha sido o personagem, ele é o grande exemplo em uma guerra que beira a estupidez: mais preocupado com os seus fúteis interesses pessoais, o personagem encara a guerra como uma brincadeira, vive na retaguarda (enquanto os seus homens explodem em meio a batalha) e demonstra saudosismo ao falar que um dia a guerra chegará ao fim. Kilgore chega ao absurdo de ordenar um ataque de Napalm apenas para poder surfar no único lugar do Vietnã que possui ondas - enquanto isso, reconhecemos as explosões dos Napalms como sendo as mesmas que abrem o filme e que simbolizaram as marcas deixadas pela guerra na mente de Willard, o que não deixa de ser terrivelmente irônico.
Apocalypse Now é um filme que, além de retratar com perturbador realismo o horror de uma das mais terríveis e lamentáveis guerras do século XX, nos mostra, com toques de ironia e humor negro, a moralidade burra por trás da guerra e a hipocrisia que ronda qualquer discurso que tente justificá-la (afinal, há sempre interesses ambiciosos e egoístas). Dessa forma, o longa surge também como uma crítica a um episódio da História sobre uma guerra insana que, em suas batalhas de cada dia, transparecia a hipocrisia, o vazio ideológico, o interesse próprio, a desumanização, a violência extrema, e a falta de valores humanitários, capaz de levar até o melhor dos soldados a sofrer efeitos psicológicos sem precedentes, perdendo a si mesmo no caminho ou tornando-se uma figura completamente transtornada, assim como Kurtz e Willard, respectivamente. Em Apocalypse Now, a guerra é, em todas as suas instâncias, injustificável e o maior sinal de nossa irracionalidade e insanidade - e é por todos esses fatores que esse filme continua sendo tão atual quanto a trinta anos atrás.
Obs: o próprio Francis Ford Copolla faz uma participação especial curtinha no filme como o diretor da equipe de TV que faz a cobertura da guerra em determinada sequência.
Cotação: Excelente
Caio, tá certo que eu tinha 15 anos quando tentei ver esse filme. Mas até hoje tenho ele como uma das piores experiências cinematográficas da minha vida! Ainda bem q era na tv e eu pude mudar de canal após insistir por 30 min.
ResponderExcluirTu jura q eu tenho q dar outra chance?
Ah, sugestão: O Selvagem da Motocicleta, pra mim, o filme mais lindo do Coppola
hehehe... tenta dar outra chance, de repente pode gostar. Já faz mais de dez anos, de lá pra cá muita coisa mudou. Com 15 anos eu nem sabia assistir a um filme. rs
ResponderExcluirGuardei a sugestão! :)